sábado, 30 de março de 2024

Cidadã do mundo

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“Mas quantas residências você quer ter?”, me perguntou em tom jocoso meu colega de trabalho depois de eu mencionar em uma call que teria que voltar para a Argentina a cada dois anos para não perder minha residência. Não soube o que responder além de rir, porque, bem, quantas residências uma pessoa pode querer? Com uma já deveria ser suficiente, mas acho que meu plano era ter mais residências do que calças jeans.

A verdade é que desde que cheguei a Barcelona, não tenho certeza se sou de muitos lugares ou de nenhum. Para começar, ninguém sabe direito em que idioma falar comigo. Na porta do museu, no restaurante, na delegacia onde registrei minha residência espanhola. Geralmente, há duas reações padrão: a primeira é me olhar com a mais profunda expressão de confusão até eu finalmente estabelecer um diálogo, e a segunda é começar a falar comigo diretamente em inglês mesmo, para garantir.

Na entrada do Castelo de Montjuïc, a moça que controla os ingressos tentou falar comigo em inglês, mesmo depois de ouvir meu "hola". Ela perguntou se eu tinha comprado o audioguia, ao que respondi que “no”, com o sotaque hispânico que me corresponde. Mas ela continuava convicta, até eu dar uma resposta mais longa em espanhol para sua seguinte pergunta em inglês, aí ela se deu conta. "¡Ah, hablas español!", disse surpresa.

Também perguntam se sou argentina, por que falo como uma argentina se nasci no Brasil, e por que nasci no Brasil, falo como uma argentina, tenho nacionalidade luxemburguesa e moro na Espanha. "E se nos sentamos e pedirmos uma cerveja?", tenho vontade de responder.

"Ai, Luxemburgo é tão lindo!", também me dizem ao pegar o passaporte cor de vinho da minha mão para proceder com algum trâmite. E eu sem saber como explicar que nunca pisei no país do meu tatara tataravô, mas que em breve resolverei essa questão. Não, senhor, também não falo francês. Pas encore.

Fora isso, tudo corre com normalidade. Ou com a normalidade esperada neste contexto. Ninguém tentou falar comigo em catalão e eu e os espanhóis nos entendemos perfeitamente. Com isso basta.


*Este texto foi escrito originalmente em espanhol e traduzido ao português.

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