Sucursais do inferno

Em dezembro eu tinha dito aqui que escreveria um texto explicando por que eu (e grande parte das pessoas que trabalham na área de publicidade na Argentina) trocam tanto de emprego. Uma das minhas aspirações para 2020 era,inclusive, conseguir outro - e, pasme, já aconteceu - depois de apenas seis meses trabalhando em uma agência. Além de todos os motivos que levam qualquer pessoa em qualquer parte do mundo e em qualquer área a querer buscar algo melhor, na Argentina se soma a isso o fator inflação. Se você trabalha em uma empresa grande, séria, de preferencia em uma multinacional, seu salário aumenta de acordo com a inflação. Pelo menos duas vezes por ano há um reajuste. Se os funcionários estão em um sindicato, o reajuste é definido por ele, e se não, a empresa decide quando e quanto vai aumentar.

Como a realidade da esmagadora maioria das agências de publicidade é muito diferente de “uma empresa grande, séria, multinacional”, você se encontrará em problemas se é funcionário de alguma delas. Em primeiro lugar, elas pagam muito menos que “uma empresa grande, séria, multinacional”, mas até aí tudo bem, supõe-se que vocês chegaram a um acordo sobre o salário no momento da contratação e você considera que está bem, que dá pra viver com isso.

Três meses depois, esse numerozinho já se desvalorizou uns 10%. No fim do primeiro semestre, seu salário vale uns 25% menos que quando você entrou, e esse é o momento em que a empresa deveria ajustar seu salário com base na desvalorização sofrida. Só que, lembrando, você trabalha em uma agência. As agências em geral nem te colocam no sindicato dos trabalhadores de publicidade e, quando colocam, não faz a menor diferença, já que não dão bola para o que ele diz.

Então, seis meses depois você vai ouvir do seu chefe, ou do RH, que “infelizmente estamos passando por um momento difícil e o reajuste será somente dentro de x meses”, ou, com sorte, que “estamos passando por um momento difícil e o reajuste no momento será de apenas 10%, mas para o próximo semestre temos melhores expectativas”.

Passam mais seis meses, seu salário se desvalorizou mais uns 25%, mas “infelizmente o país ainda passa por um momento complicado, então novamente o reajuste será de 10%” e aí é quando você se dá conta de que vai ser assim para sempre e que dentro de dois anos estará passando fome se a coisa continuar nesse ritmo. E, bom, é preciso começar de novo. Procurar outro lugar, definir um salário que está bom pra você, seis meses depois receber um reajuste muito abaixo da inflação e assim ad infinitum.
Esse ciclo se faz eterno porque obviamente é muito mais fácil conseguir trabalho em agência, tem uma em cada esquina e estão todos saindo e entrando e abrindo vagas todos os dias, então depois de um tempo procurando emprego sem sucesso em “uma empresa grande, séria, multinacional”, você termina em outra agência de improvisados.

Eu quis ir da minha última agência antes dos seis meses porque a única pessoa que trabalhava ali havia mais de um ano disse que seu primeiro reajuste veio só depois de 12 meses, e não seis. E também porque foi o pior lugar que trabalhei na vida, e olha que meu primeiro emprego como jornalista foi um verdadeiro pesadelo.

Esta vez, no entanto, estive um mês procurando e há uma semana tive a sorte de entrar em “uma empresa grande, seria, multinacional”, que me colocou no sindicato do comércio.
No meio de todo esse drama eu só conseguia pensar em por que eu não decidi ser web developer antes de me tornar uma senhora que faz sua própria geleia.